O pesadelo vivido por refugiados e migrantes na Líbia

Devido ao contexto líbio, as pessoas migrantes e requerentes de asilo estão sujeitas a todo o tipo de violência no país enquanto tentam chegar à Europa pelo Mar Mediterrâneo. Encurraladas, as são expulsas das imediações europeias e obrigadas a retornar aos abusos.

A Líbia é um país localizado no norte da África, banhado pelo Mar Mediterrâneo e que possui mais de 6 milhões de habitantes. Grande parte do território líbio é ocupado pelo deserto e com grandes reservas de petróleo, sendo a Líbia um membro da OPEP.

Fonte: Google maps.

Ocupada anteriormente pela Itália, a Líbia conquistou sua independência em 1951 e depois disso passou a ser governada, majoritariamente, por ditadores. 

 Já em 2011, o país foi palco de uma das faces mais sangrentas da Primavera Árabe, o que resultou na queda de Muamar Kadhafi, apoiada pelo ocidente, que havia alcançado o poder por meio de um golpe de Estado e governou o país por mais de 40 anos.

 Atualmente o país é marcado pela instabilidade política, governado por dois grupos distintos: o Amanhecer, coalizão de milícias com sede em Trípoli, e o governo reconhecido pela comunidade internacional, situado em Tobruk. Além disso, há cerca de 1.700 grupos armados no país com interesses diversos. Todas essas disputas de poder e interesses conflitantes, islâmicos, separatistas ou liberais, mergulharam o país em uma guerra civil e grande corrupção.

A realidade líbia também é marcada pelo desrespeito aos direitos humanos e condições de vida desafiadoras, com acesso à água, saneamento básico e comida restritos. A enchente ocorrida no norte do país em setembro passado impôs ainda mais dificuldades às condições de vida da população e deixou aproximadamente 20 mil mortos.

Fonte: Maxar Technologies via BBC.

A situação das pessoas refugiadas e migrantes

Junta-se a esse cenário caótico outros milhares de refugiados e migrantes que tentam chegar à Europa através do território líbio, e são vítimas de assassinato, sequestro, trabalho forçado, tortura, detenção arbitrária, xenofobia e violência sexual.

Dados da OIM de 2023 estimam que haja mais de 700 mil imigrantes na Líbia, de 44 nacionalidades diferentes, vindos principalmente do Níger e do Egito. Dentre eles, cerca de 5mil estão detidos, mais de 900 foram mortos e 1256 estão desaparecidos.

 ONU acusada de omissão

Em 2021 cerca de 4mil pessoas, entre migrantes e militantes, protestaram em frente a sede das Nações Unidas em Trípoli por mais de cem dias, exigindo a evacuação para países seguros. O protesto pacífico foi encerrado pelo exército líbio que deteve inúmeras pessoas.

Algumas organizações acusam a ACNUR de omissão em meio as infrações aos direitos humanos que ocorrem na Líbia. A atuação da agência encontra ainda diversos impedimentos no país, tendo sido interrompida uma primeira vez em 2010 por ordens do governo, e também em 2020, quando seu gabinete encerrou as atividades devido a ameaças à segurança.

Já em 2023, a organização Médicos Sem Fronteiras encerrou suas atividades nos centros de detenção da capital, Trípoli, pela falta de condições de que dispunham para atender as pessoas. A organização, bem como a ACNUR, denuncia o desrespeito aos direitos humanos na Líbia.

 Políticas europeias

Segundo a OIM, mais de 15 mil pessoas foram interceptadas no mar Mediterrâneo e devolvidas à Líbia em ações de externalização fronteiriça promovidas pela União Europeia.

Além disso, a ausência de proteção e suporte eficiente por parte dos estados europeus tem causado prejuízos e deixado essa população, já tão vulnerável, morrer à míngua no Mediterrâneo, sendo o ano de 2023 o mais mortal desde 2017, com cerca de 2200 mortos ou desaparecidos.

Fonte: EPA via Público.

Com o novo Pacto Europeu para as Migrações a situação tende a piorar com procedimentos que ferem a dignidade dos migrantes e requerentes de asilo, como detenções fronteiriças e procedimentos acelerados que facilitam a deportação.

 

Vale lembrar que as crises humanitárias são de responsabilidade global e em muitos casos são causadas pela intervenção ocidental que desequilibra a política interna, ataca a democracia e a soberania dos Estados. Os distúrbios internos também podem ser causados pelo passado colonial que impediu a construção e fortalecimento de países que hoje tem uma estrutura enfraquecida ou inexistente, sendo mais suscetíveis a golpes e crises internas graves.

 

Artigo escrito pela voluntária Andressa Gomes: licenciada em história, pós-graduada em relações internacionais e mestre em segurança e defesa. Brasileira e imigrante. Interessada em direitos humanos e apaixonada por aprender enquanto viaja. Atualmente vive no Porto, Portugal.

 

Referências:

https://www.amnesty.org/en/location/middle-east-and-north-africa/libya/report-libya/

https://dtm.iom.int/reports/libya-migrant-report-46-january-february-2023

https://www.msf.org/libya

Imagem de capa: Aline Sagarbi via CNN Brasil.

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